O USO INDISCRIMINADO DE APARELHOS CELULARES DURANTE O SERVIÇO DE POLICIAMENTO OSTENSIVO, EM PREJUÍZO À SEGURANÇA DA COMUNIDADE E DOS POLICIAIS MILITARES

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Cristian Dimitri Andrade [1]

O uso indiscriminado, em serviço, do celular pelos nossos policiais, está colocando em "xeque" a segurança das nossas guarnições e, consequentemente, da comunidade. No momento em que testemunhamos esta conduta na prática, bem como, quando recebemos informações de policiais mais antigos ou até mesmo dos mais novos (porém mais operacionais e conscientes), preocupados com esta situação instalada, é preciso fazermos uma reflexão e ficarmos mais atentos.

Os Policiais estão notando, de forma mais acentuada, que o seu companheiro de serviço está na maior parte do tempo utilizando o seu celular, quer seja durante o patrulhamento ostensivo na viatura policial ou a pé, quer seja na segurança de uma área de vulnerabilidade social, durante uma abordagem a pessoas em atitudes suspeitas, ou ainda, durante o seu quarto de hora como sentinela em instalações militares ou no ponto de observação da viatura. O militar fica utilizando os aplicativos de WhatsApp, Telegram, entre outros, bem como fica postando fotos em tempo real, com a imagem dos indivíduos abordados, para outros companheiros de setores distintos. Uma situação aparentemente normal, mas que implica diretamente na segurança dos atores envolvidos no serviço de manutenção da ordem pública.

Com a distração, o policial deixa de visualizar elementos em atitude suspeita durante o seu turno de serviço, lojas com portas de correr entreabertas durante o expediente, mudança de itinerários de veículos que avistam a viatura policial, pessoas que dispensam objetos nas proximidades, masculinos que utilizam roupas quentes durante o verão (casacos, japonas), indivíduos que entram de capacetes em estabelecimentos comerciais, além de uma infinidade de outras ações que passam despercebidas, sendo isto inconcebível para um profissional de segurança pública, bem como para a comunidade que espera um serviço de excelência da Polícia Militar.

 A proposta seria a criação de uma normativa interna pelas Corporações, visando à construção de uma regulamentação própria, destinada a limitar o uso em serviço do celular dos policiais, naqueles casos, em que a utilização coloca em risco a segurança de todos (comunidade e policiais). O objetivo seria salvaguardar todos os atores envolvidos no teatro de Operações, além de responsabilizar administrativamente os agentes encarregados pela aplicação da lei, que utilizarem de forma indevida estes dispositivos durante a sua jornada de serviço.

Outras Corporações, a exemplo da Polícia Militar do Estado de São Paulo e de Minas Gerais, que costumam ser pioneiras na criação de doutrinas para os demais Estados do Brasil, já possuem regulamentação própria nesse sentido e/ou realizam propaganda de marketing institucional, a fim de alertar os PMs sobre os riscos para a segurança individual e coletiva, quando o militar fica distraído por segundos preciosos, o que pode custar a vida de um cidadão inocente, do próprio policial militar, além de seus companheiros de serviço.

Sabemos que também existe o lado positivo da utilização das ferramentas de aplicativos nos celulares e tablets, tais como a chegada rápida da informação ao policial na rua e a consequente troca de informações através das imagens, áudios, arquivos e vídeos. Em tempo real, os policiais interagem as informações de possíveis suspeitos de crimes ocorridos, bem como sugerem rotas de fugas utilizadas em assaltos em andamento, também dão dicas de prováveis paradeiros dos meliantes, informam a situação de veículos recém furtados ou, ainda, o envolvimento de veículos suspeitos de participarem de crimes em estabelecimentos comerciais e residenciais.

Também há aplicativos que auxiliam na busca pelo histórico de antecedentes criminais, mandados de prisão ativo, participação em boletins de ocorrências, tal como o SISP; outros, que realizam a busca de placas e históricos de veículos furtados e com restrições judiciais, tal como o “DETRANET” e, ainda, os que ajudam a armazenar o cadastro de indivíduos presos pela justiça. Hoje, até mesmo o cidadão pode baixar um aplicativo para consultar placas de veículos e mandados de prisão, por meio do aplicativo “SINESP CIDADÃO”. Como esses, há uma infinidade de novas tecnologias que estão ajudando de forma direta no combate à criminalidade, bem como criando uma interação entre os Policiais de diversos Estados da Federação e das Agências de Inteligência dos órgãos da justiça e de Segurança Pública.

Uma ferramenta bastante utilizada para facilitar a comunicação entre as pessoas é a criação de grupos em aplicativos, tais como WhatsApp e o Telegram. Um dos exemplos que está auxiliando de forma direta a segurança pública é o grupo “Ações Integradas”, criado em 20 de agosto de 2014, pelo 3º Sargento PMSC RR Jorge Luiz da Silva, lotado na época na Diretoria de Informação e Inteligência (DINI), da Secretaria de Segurança Pública de Santa Catarina. O grupo hoje é composto por cerca de 157 participantes, das mais diversas Forças de Segurança Pública do Brasil e do Mercosul, quer sejam, Polícia Federal, Polícia Militar, Polícia Civil, Corpo de Bombeiros Militares, Batalhão de Aviação da PM e do Bombeiro, Polícia Rodoviária Federal e Estadual, Diretoria e Agências de Inteligência, Exército Brasileiro, Batalhão de Polícia de Fronteira, Batalhão de Operações Policiais Especiais, Instituto Geral de Perícias, Departamento de Investigacíon de Delitos de la Policía Nacional del Paraguay, Agentes Penitenciários ligados ao Departamento de Administração Prisional (DEAP/SC), entre outros órgãos de segurança.

A cultura da distração está instalada. É preciso conscientizar nossos policiais militares nos briefings, nas preleções antes de saírem para o efetivo serviço nas ruas, a fim de que os mesmos tenham mais atenção durante a sua jornada de trabalho. É preciso uma maior conscientização dos operadores de segurança pública para não serem apanhados de surpresa pelos agentes infratores da lei e, assim, poderem prestar um melhor serviço à comunidade e regressar com saúde ao convívio familiar.

Nós policiais militares e demais integrantes das forças de segurança estamos vivendo numa literal “selva de pedra” e, quando a selva cobra, geralmente ela pode cobrar muito caro. Atualmente o policial sai para o seu trabalho sem a certeza do retorno ao seu lar. A Polícia Militar é uma das únicas profissões no Brasil, assim como o Corpo de Bombeiros Militar e as Forças Armadas, em que os seus membros prestam o compromisso de defender a sociedade, mesmo com o risco da própria vida.

Sendo assim, faz-se necessário redobrarmos a atenção ao serviço e nos mantermos em constante estado de alerta. Uma das leis do Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), do Exército Brasileiro, sediado em Manaus, cita a atenção que o militar deve dispensar ao seu habitat natural, sob pena de não regressar para a sua casa: "Pense e aja como caçador, não como caça”. ­­­­­­


[1] Major da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina e Subcomandante do 19° BPM sediado em Araranguá – SC. Possui Curso de Formação de Oficiais da PMSC – APMT – Florianópolis-SC/1995, é bacharel em Direito pela UNESC – Criciúma-SC/2006 e pós-graduado em Administração em Segurança Pública pela UNISUL – Florianópolis-SC/2010.