CARREIRA JURÍDICA, UMA REALIDADE, NECESSIDADE E INEQUÍVOCA PROVA DE RESPONSABILIDADE.

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Na condição de Presidente do Conselho Deliberativo da vetusta Associação de Oficiais da Polícia Militar do Estado de São Paulo, cabe-me a presente reflexão, após tantos anos de vivência e participação desde sempre nos assuntos de interesse da Segurança Pública do nosso país.

Seguramente, a utilização, no nosso meio, dos termos linguísticos próprios de quem vive as discussões técnicas na Justiça, não pode, por si só, garantir a solução dos crimes não esclarecidos, do mesmo modo que os economistas são impotentes, somente com seus gráficos e cálculos, para alterar a Economia e produzir melhores resultados agrícolas para acabar com a fome, como os médicos, com suas formas de diagnóstico e intervenções, não podem sozinhos evitar ou curar todas as doenças que afligem a humanidade. Há enormes fatores a influenciar cada situação.

E não estamos na análise do problema, ainda. Os números infelizes das nossas soluções de casos criminais, e eles são assustadores, passam obrigatoriamente por uma reflexão, tão profunda quanto é a consciência de cada qual. Há gargalos em cada segmento do Sistema de Segurança Pública do país, se refletem diretamente nas propostas de mudança que estão em todos os foros de discussão nacional, e o processo é constante, como se deveria esperar de uma sociedade livre, democrática e que inova em todos os sentidos.

No que se refere objetivamente à seleção de Oficiais da Polícia Militar já bacharéis em Direito, ajudaria sobremaneira em todos estes gargalos, catapultaria a missão da Preservação da Ordem Pública, como determina o “mandamus” constitucional, de modo significativo e permitiria o paulatino aprimoramento de tão significativo serviço para a sociedade brasileira, em todos os padrões.

O oficial bacharel em Direito, aprovado em concurso de títulos e provas, com seus conhecimentos, poderia sim avançar em aspectos hoje ainda não experimentados no atendimento de ocorrências criminais, especialmente naquelas de interesse maior da estatística da Justiça Criminal tão criticados por todos os outros segmentos e também por nós.

Se o Poder Judiciário se vê, hoje, às voltas com o volume de processos, que atravanca seus preciosos trabalhos para premiar aqueles que cometem ilicitudes mais danosas, é porque o sistema de persecução não vai bem, há falhas no processo de coleta de provas, o que permite que sejam levados aos tribunais procedimentos e processos sem a menor possiblidade de formação de culpa. É erro de método? É erro de sistema? É necessário mudar? Pois bem, nos propomos dar nossa contribuição.

A Academia de Polícia Militar do Barro Branco tem formado Oficiais PM a partir de concurso público de alta procura entre jovens com o segundo grau. Nessa especial escola de formação, o currículo de matérias tende a ser composto em quase 75% por matérias Jurídicas, razão pela qual entendemos ser injustificável desperdício não aproveitar os já vocacionados, homens feitos e decididos, para que acorram ao concurso público de ingresso na carreira. E mais, dadas as peculiaridades do comandamento, e falo com experiência de décadas nas atividades fim da Corporação e não com atuações episódicas, que a missão requer uma Escola de Disciplina, Hierarquia e Treinamentos como se desenvolve hoje em Brams Hill da Scotland Yard e na École des Officiers de la Gendarmerie Nationale (EOGN), da gendarmerie  francesa, de onde surgiram as atuais melhores polícias do mundo, juntamente com as alemãs, que escolheram pós-graduar, e especializar os já graduados em Direito durante 2 anos, em extensivos e objetivos cursos, nos quais todo o conhecimentos resultante das experiências centenárias dessas organizações, podem ser assimilados.

O reconhecimento do exercício da carreira policial como jurídica, advém de evolução, de economia, de inteligência de um processo de inovação que se clama internamente em resposta à necessidade de todo segmento social. O que poderia ferir esta evolução? A quem não interessaria impor o Direito como meta estratégica e tática da organização? No que sua adoção prejudicaria a sociedade? A proposta de emenda à constituição (PEC) de número 3 de 2014 à Assembleia Legislativa de nosso Estado, exaure esta inovação, dever de resposta e, como tal, ofertada que foi pelo então Deputado Coronel Ferrarini, com a adesão de 55 parlamentares, deixa claro o interesse da sociedade que a oficialidade PM se afaste em definitivo de ser mero agente de persecução criminal, porque deixar a disposição somente do Ministério Público, titular da ação penal, todo e qualquer trabalho para elucidação dos fatos criminais, é agir como se fôssemos entidades estanques, sem a devida relação com os interesses maiores da sociedade, o que não se coaduna conosco enquanto categoria profissional de Estado, em primeiro lugar pelo nosso declarado amor à causa pública, que vem de nossa fé no Brasil e tem a história da Corporação por testemunha. Em segundo lugar, por causa da devassidão que é nossa dívida de cruz e sangue com nossos colegas e subordinados, vítimas atrozes e alvos principais do crime que se organiza dia a dia e finalmente em terceiro lugar, pela obediência fiel à lei e à ordem, objetivos máximos da polícia em qualquer sociedade civilizada.

 

Milton Cardozo Ferreira de Souza

Coronel PM Presidente do Conselho Deliberativo da Associação de Oficiais da Polícia Militar de São Paulo.