IMPOSSIBILIDADE DE REGIME DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PARA MILITARES

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Um fato importante, porém que poucos abordam, parecendo tabu, é sobre a previdência ou regime previdenciário dos Militares.

Em todo o mundo os militares, sejam de forças de segurança (polícia) ou de forças armadas, possuem regimes jurídicos provenientes de sua investidura, com diferenças básicas dos servidores e demais trabalhadores civis.
No Brasil, a própria Constituição Federal de 1988 prevê em vários dispositivos nela contidos onde destaca a diferença dos militares brasileiros dos demais cidadãos levado pelo regime jurídico diferenciado entre ambos, embora todos ao final sejam brasileiros.
Sobre a condição diferenciada dos militares dos Estados e do Distrito Federal dos demais agentes públicos chama a atenção o especificamente na Constituição Federal o Artigo 42 que diferencia os militares dos servidores combinando com dispositivos do Artigo 142, também da Constituição Federal, onde afirma categoricamente as condições especialíssimas a que os militares estão submetidos, tanto na ativa quanto na reserva e reformados, e como dito, diferenciando-os totalmente dos demais agentes públicos nas prerrogativas, nos direitos e principalmente nos deveres, que os alcançam inclusive na inatividade e por toda a sua vida, algo que não ocorre com nenhuma das carreiras públicas.
À saber sobre o Art 42 da CF:
Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios
§ 1º Aplicam-se aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, além do que vier a ser fixado em lei, as disposições do art. 14, § 8º; do art. 40, § 9º; e do art. 142, §§ 2º e 3º, cabendo a lei estadual específica dispor sobre as matérias do art. 142, § 3º, inciso X, sendo as patentes dos oficiais conferidas pelos respectivos governadores
§ 2º Aos pensionistas dos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios aplica-se o que for fixado em lei específica do respectivo ente estatal
O Artigo 142 mencionado no Art 42 por sua vez diz:
§ 2º – Não caberá "habeas-corpus" em relação a punições disciplinares militares.
§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições
I – as patentes, com prerrogativas, direitos e deveres a elas inerentes, são conferidas pelo Presidente da República e asseguradas em plenitude aos oficiais da ativa, da reserva ou reformados, sendo-lhes privativos os títulos e postos militares e, juntamente com os demais membros, o uso dos uniformes das Forças Armadas; 
 II – o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente será transferido para a reserva, nos termos da lei; 
 III – O militar da ativa que, de acordo com a lei, tomar posse em cargo, emprego ou função pública civil temporária, não eletiva, ainda que da administração indireta, ficará agregado ao respectivo quadro e somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por antigüidade, contando-se-lhe o tempo de serviço apenas para aquela promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois anos de afastamento, contínuos ou não, transferido para a reserva, nos termos da lei; 
IV – ao militar são proibidas a sindicalização e a greve; 
V – o militar, enquanto em serviço ativo, não pode estar filiado a partidos políticos; (
VI – o oficial só perderá o posto e a patente se for julgado indigno do oficialato ou com ele incompatível, por decisão de tribunal militar de caráter permanente, em tempo de paz, ou de tribunal especial, em tempo de guerra; 
VII – o oficial condenado na justiça comum ou militar a pena privativa de liberdade superior a dois anos, por sentença transitada em julgado, será submetido ao julgamento previsto no inciso anterior; 
VIII – aplica-se aos militares o disposto no art. 7º, incisos VIII, XII, XVII, XVIII, XIX e XXV e no art. 37, incisos XI, XIII, XIV e XV; 
X – a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra. 
Também de maneira muito rápido e para clarear a questão ainda mais citamos o Art 22 caput e o inciso XXI do referido dispositivo:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
XXI – normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares;
Temos também a lei Federal instituída através do Decreto-Lei Federal 667/69 em vigor, que reorganizou as instituições Policiais Militares e Bombeiros Militares em todo o país e regulamentado pelo Decreto Federal n 88.777/83, estabelecendo à respeito o seguinte:
        Art . 19 – Os policiais-militares na reserva poderão ser designados para o serviço ativo, em caráter transitório e mediante aceitação voluntária, por ato do Governador da Unidade da Federação, quando:
        1) se fizer necessário o aproveitamento de conhecimentos técnicos e especializados do policial-militar;
        2) não houver, no momento, no serviço ativo, policial-militar habilitado a exercer a função vaga existente na Organização Policial-Militar.
        Parágrafo único – O policial-militar designado terá os direitos e deveres dos da ativa de igual situação hierárquica, exceto quanto à promoção, a que não concorrerá, e contará esse tempo de efetivo serviço.
Ainda o Código Penal Militar e os regulamentos disciplinares militares possuem a previsão expressa que os militares mesmo após ingressarem na reserva remunerada continuam sujeitos à eles pois segundo a lei permanecem nos quadros da Instituições Militares embora na condição de reserva remunerada ou reformados, algo que em situação nenhuma ocorre com os civis, mesmos agentes públicos.
Tanto isso é verdade que neste momento estou me contendo para não ultrapassar nas minhas considerações os limites impostos pela legislação penal e/ou disciplina militar, mesmo atualmente pertencendo ao quadro de oficiais da reserva da instituição.
É bem verdade que o constituinte derivado alterou o regime previdenciário dos agentes públicos civis após 1988, modificando assim o que determinou o constituinte originário, no entanto, NÃO o fez em relação aos militares, não estendendo a estes nenhuma alteração, ao contrário manteve-os em condições especiais no que diz respeito aos aspectos previdenciários.
Mesmo considerando tudo o que foi supra apresentado, recentemente o Governo do Estado de Santa Catarina encaminhou um Projeto de Lei Complementar ao Parlamento Catarinense pretendendo instituir o Regime Complementar de Previdência para os servidores do Estado e, pasmem, incluiu inconstitucionalmente os militares no mesmo projeto de lei.
Como vimos nos dispositivos constitucionais e legais apresentados, o executivo do Estado pode apresentar projetos estabelecendo as condições de passagem do militar para a reserva remunerada ou reforma, contudo deverá fazê-lo em legislação “específica” e respeitando as condições especialíssimas a que o militar é submetido em toda a sua vida na atividade e inatividade. Ele, o militar permanecerá eternamente ligado a instituição militar, tanto que, diferente do civil, pertencerá em seus quadros até sua morte, carregando “nas costas” além dos direitos e prerrogativas os seus DEVERES, incluindo o de obediência hierárquica e sujeição a reconvocação, algo que jamais ocorre com os demais agentes públicos.
O Governo do Estado quando pretende tratar os militares de maneira igualitária aos civis descumpre flagrantemente a lei e a Constituição Federal, e neste sentido, ainda bem que existe primeiramente o legislativo, que espero corrija tal distorção, e após as instâncias do judiciário para restabelecer o ordenamento constitucional e legal em vigor, impedindo tal afronta.
Se os governos estaduais pretendem tratar os militares, repito submetidos a condições diferenciadas do agente público civil, algo que carrega enquanto no serviço ativo quanto na reserva ou reformado, terá que alterar primeiramente o ordenamento constitucional e legal federal para somente após fazê-lo.
Há sim até forma alterar “alguns poucos” aspectos previdenciários com referência aos militares, desde que o faça em legislação “específica” e não no bojo de uma mesma legislação comum a os servidores em geral. Isso não pode.
Isso é tão verdade que em Santa Catarina o Governo do Estado reconheceu na legislação complementar que instituiu em 2008 o Regime Previdenciário atual do servidor estadual através da Lei Complementa 412, quando estabeleceu no seu Artigo 92 que somente se aplica alguns pouquíssimos dispositivos da mesma aos militares até que fosse adotado pelo Estado a Regime Próprio de Previdência dos Militares e que até isso ocorrer se aplicaria o Estatuto dos Militares, justamente pela suas condições especialíssimas do agente público militar.
Ora os militares estão, então, aguardando o tal Regime Próprio de Previdência dos Militares, o que por certo até agora não ocorreu e talvez seja a oportunidade do executivo estadual fazê-lo.
Querer tratar os militares que pertencem a uma instituição militar com regime jurídico diferente dos civis, de forma igualitária é não observar nem mesmo o como diz o constitucionalista Ives Gandra: “as instituições militares são de utilização nas crise e utilizadas sem ressalvas nestas situações, pois seus integrantes devem permanecer sob condições rígidas e diferenciadas de hierarquia e disciplina, para bem cumprir tais missões sem titubeio e colocando em risco a sua vida”, então querer que sejam “obedientes” e diferentes sem tratamento previdenciário diferenciado é fugir da razoabilidade e pretender, aí sim, que sejam cidadãos de segunda categoria.
Se o Estado em nome da sociedade submete e necessita que um grupo de pessoas denominados militares permaneça toda sua vida produtiva na carreira dedicada à servir desta forma à sociedade, deve também retribuí-lo de forma diferenciada e adequada. Isso é fazer justiça. É assim que “funciona” em qualquer rincão do mundo moderno já há séculos.
Se assim não fosse, além do patriotismo, o que então levaria esses cidadãos que são os militares permanecerem por anos e anos submetidos a essa condição diferenciada com direitos e deveres restritos e diferentes dos civis sem qualquer retribuição diferenciada de vida para servir à sociedade em tempo integral e sem titubeios? Será que teríamos pessoas que se atreveriam a ser militar?
Somente um cego, tendencioso, apedêuta, revanchista ou mal-intencionado não tem noção disso.
Esquecem, contudo aqueles que apresentaram o mencionado e equivocado Projeto de Lei em questão, que os militares são iguais a todos os demais cidadãos, ainda bem, num aspecto: diante da URNA eleitoral.  
Parece que se esquecerem de que o voto do militar (e de sua família e amigos) possui o mesmo valor do voto de um civil, e com certeza nos pleitos eleitorais futuros, se prosperar a pretensão do tresloucado projeto de lei complementar, saberão identificar os políticos (ou político) autores (autor) disso para lá nas urnas demonstrar sua insatisfação, podem apostar nisso.
O militar é obediente, porém não burro nem imbecil, possuindo memória e aprendeu ao longo do tempo a ser unido e politizado.
O que rogamos é a reflexão urgente de todos sobre tema tão relevante e esperamos, sinceramente, que o legislativo ou o próprio Governo do Estado que encaminhou tal proposta, corrija as distorções apontadas e trate, como já está ocorrendo em outros Estados do Brasil, os militares de forma diferenciada e justa.
Que, se for o caso, sejam os militares tratados em legislação apartada e específica face sua condição diferenciada de prestação de serviço ao longo da sua vida, sob pena de que quando dele necessitar poderá não tê-lo de forma integral para atender as necessidades da sociedade.